Crateras em Marte Estão Contando Segredos Ocultos por Milhões de Anos

Pesquisadores descobriram que crateras de impacto em Marte podem revelar o que está escondido sob sua superfície, como gelo e camadas rochosas. Entenda como os padrões de ejeção ajudam a explorar o subsolo marciano sem perfuração.

NOTICIASASTRONOMIAGEOLOGIA

David Braian

5/19/20253 min read

As crateras que cobrem a superfície de Marte não são apenas cicatrizes de eventos antigos. Hoje, elas estão se tornando ferramentas valiosas para revelar os segredos ocultos do planeta — e mais do que isso: podem ajudar a proteger a Terra de ameaças vindas do espaço e guiar as futuras missões humanas a Marte.

Uma Técnica Inovadora para Ler o Subsolo Marciano

Pesquisadores da Brown University, em colaboração com o Imperial College London, desenvolveram um método inovador para estudar o interior de Marte usando não apenas a forma das crateras, mas o padrão de dispersão dos detritos ejetados após os impactos.

Ao simular diferentes tipos de materiais sob a superfície — como rocha sólida, gelo e sedimentos —, os cientistas notaram que o modo como o material é arremessado durante um impacto varia conforme a composição subterrânea. Um padrão de ejeção mais amplo, por exemplo, indica que o impacto ocorreu sobre rocha sólida, enquanto padrões mais concentrados sugerem gelo ou sedimentos soltos abaixo da superfície.

Essa descoberta permite estudar o que está enterrado em Marte sem perfurações ou instrumentos em solo — apenas com imagens orbitais.

Aplicações que Vão Além de Marte: Asteroides e Defesa Planetária

Esse tipo de análise também tem implicações importantes fora de Marte. Um exemplo claro é o sistema de asteroides Didymos e Dimorphos, onde a NASA realizou, em 2022, a missão DART (Double Asteroid Redirect Test) — o primeiro teste prático de desvio de um asteroide.

A colisão proposital da sonda com Dimorphos demonstrou que é possível alterar a órbita de um corpo celeste, validando uma estratégia que, um dia, pode ser usada para evitar colisões com a Terra. No entanto, entender como um asteroide reage a esse tipo de impacto depende, principalmente, de conhecermos sua estrutura interna.

É aí que entra a missão Hera, da ESA, prevista para chegar ao sistema em 2026. Ela investigará a cratera deixada pela DART e como Dimorphos foi afetado. Usando padrões de ejeção, como proposto por Sokolowska e sua equipe, será possível determinar se Dimorphos é um bloco sólido ou uma “pilha de entulho” — algo que muda radicalmente o efeito de um impacto.

A Nova Corrida por Recursos em Marte

À medida que missões tripuladas a Marte se aproximam da realidade, a capacidade de identificar recursos no subsolo será essencial. O uso local de materiais disponíveis (ISRU – utilização de recursos in-situ) pode ser o diferencial entre uma missão bem-sucedida e um fracasso logístico.

Com as novas técnicas, cientistas podem mapear o gelo subterrâneo e outros elementos úteis antes mesmo de um pouso. Isso permite selecionar áreas estratégicas com acesso rápido a água, essencial para consumo, produção de oxigênio e até combustível para retornar à Terra.

Esse tipo de preparo pode reduzir custos, simplificar missões e garantir segurança aos astronautas — tudo sem sequer tocar o solo marciano.

Marte e a Busca por Vida: O Que Está Escondido Pode Ser Vital

O subsolo de Marte guarda mais do que gelo. Ele pode conter pistas sobre a história antiga do planeta e até mesmo vestígios de vida. Durante bilhões de anos, quando Marte tinha água líquida em abundância, condições favoráveis podem ter permitido o surgimento de vida microbiana.

Com o resfriamento do planeta e a perda da atmosfera, essa possível vida poderia ter migrado para o subsolo, onde ainda existiriam bolsas de calor e água líquida. Técnicas de mapeamento orbital capazes de detectar gelo enterrado podem, portanto, ajudar a direcionar futuras buscas por sinais biológicos.

Impacto que Traz Conhecimento

Há algo profundamente irônico — e fascinante — no fato de que colisões violentas com meteoros possam nos ensinar tanto. As crateras deixadas por esses impactos não são apenas marcas de destruição; são portais naturais para estudar o que está abaixo da superfície de mundos distantes.

A abordagem desenvolvida por Sokolowska representa um avanço real nessa leitura de ambientes ocultos. Com ela, ganhamos uma forma de “radiografar” Marte, asteroides e até outros planetas — tudo isso a partir da observação das cicatrizes deixadas por colisões cósmicas.

Em um futuro próximo, quando os primeiros humanos pisarem em Marte, é possível que o local exato do pouso tenha sido escolhido graças a essa técnica. E ao olharem para as crateras ao redor, poderão ver não apenas evidências de impactos, mas as chaves que nos permitiram chegar ali com mais segurança, inteligência e propósito.

Fonte:

Cratera tripla nas terras altas antigas de Marte, vista pela Mars Express da ESA. Crédito: ESA/DLR/FU Berlin